Simed-TO comemora 35 anos de fundação. Saiba como nasceu o movimento médico tocantinense

1ª reportagem especial – Protagonista da medicina simplificada base do SUS, Porto Nacional é o berço do movimento médico no estado
18/03/2024 20/03/2024 15:59 574 visualizações

Neste 18 de março de 2024 o Sindicato dos Médicos no Estado do Tocantins (SIMED-TO) completa 35 anos de fundação. Para marcar a data, durante esta semana será publicada uma série de matérias especiais rememorando a criação da entidade, que se consolidou como um marco do movimento médico tocantinense e nacional, na defesa da medicina de qualidade e de condições dignas de trabalho para a classe médica.

O conteúdo dessas reportagens tem como base entrevistas com médicos e médicas fundadoras da entidade e seus principais dirigentes, ao longo de mais de três décadas de atuação sindical. Inéditas, as entrevistas são a base de um livro sobre a história do Sindicato que está em produção para ser lançado em outubro, mês do médico.

Reportagem especial 1 – Protagonista da medicina simplificada base do SUS, Porto Nacional é o berço do movimento médico tocantinense

Desde sua formação, Porto Nacional se manteve como cidade histórica de relevância cultural e política do norte do Estado de Goiás. E era assim nos anos 1960, quando o município partiu de 23.005 habitantes no recenseamento de 1960 do IBGE para mais de 40 mil habitantes no final daquela década.

O antigo Porto Real, depois Porto Imperial e, por fim, Porto Nacional, após a proclamação da República, por exemplo, havia sediado naquela década o movimento separatista do Tocantins, que encontrou respaldo em uma imprensa combativa, nascida na região tocantina, aliás no próprio município, no final do século XIX e na articulação de líderes.

Em Porto, a medicina também sempre esteve em evidência, a exemplo de Francisco Ayres da Silva, primeiro filho do norte de Goiás formado em medicina.

Francisco Ayres

O jovem Francisco Ayres viveu em Goiás Velho para estudar no Seminário Santa Cruz onde se preparou para o ingresso na Faculdade de Medicina e Farmácia do Rio de Janeiro, onde defendeu a tese “Da electrolyse medicamentosa nas arthirtes” no dia 2 de janeiro de 1899, aos 27 anos.

Depois, voltou para sua terra natal, onde clinicou e difundiu a profilaxia, inclusive com publicações em colunas de saúde nos jornais locais, a mais popular "Miscelanea", que estreou dia 16 de dezembro de 1901. 

Como médico, "Dr. Chiquinho", se popularizou, contribuiu para diminuir as mazelas sociais do norte goiano, seguindo os caminhos do médico português Manoel Alves, que virou nome de dois rios tocantinenses.

Sua atuação o alçou a nome ao maior hospital público do Tocantins, na capital do novo estado no século seguinte. Em 2003, pela lei 1.409, Hospital de Referência de Palmas Dr. Francisco Ayres da Silva. Dois anos depois, a nomenclatura é atualizada pela lei 1.595 para Hospital Geral de Palmas Dr. Francisco Ayres da Silva.

Nos anos 1960, o município de Porto Nacional também se destacaria como epicentro de uma experiência coletiva de saúde pública que antecipou em duas décadas os princípios basilares do Sistema Único de Saúde (SUS), criado em 1988, por coincidência, na mesma Constituição Federal que também declarou a existência do Tocantins como unidade federativa, desmembrada do estado goiano após século de movimento separatista,  em suas disposições transitórias.

No contexto da criação do novo estado, o Sindicato dos Médicos no Estado do Tocantins, o SIMED-TO, nasceu do idealismo e da articulação dos profissionais, médicos e médicas pioneiros no estado. 

A trajetória da entidade que se entrelaça à biografia de demais médicos e médicas atuantes na demais cidades do então norte goiano, é reflexo de um contexto regional de quatro décadas anteriores, e  tornou o sindicato uma entidade determinante na discussão e formação das políticas públicas de saúde no Tocantins, e na defesa dos profissionais de medicina no estado.

Conta a história que em 1968 profissionais de saúde formados pela Universidade de São Paulo (USP), com raízes no movimento estudantil e na Juventude Universitária Católica (JUC), buscava desenvolver um trabalho de medicina integral e conheceram o norte de Goiás.

"Alimentados pelo desejo de manter o compromisso social de atuação na construção de uma sociedade justa e fraterna”, conforme explicam os médicos Eduardo Manzano e a esposa, Heloísa Manzano, dois dos principais atores dessa vivência singular, uma atuação que inspirou o casal a publicar livros sobre a experiência.

Cidade considerada carente pelo grupo que conheceu o município durante a busca por uma base para iniciar os trabalhos, Porto Nacional foi a cidade escolhida para a iniciativa. O marco era o trabalho realizado pela Unidade Mista da Organização de Saúde do Estado de Goiás (Osego), constituída de uma unidade sanitária local acoplada a um hospital com 50 leitos.

Formada então por cinco médicos, duas assistentes sociais, uma enfermeira e uma educadora a equipe fundou, em 10 de junho de 1969, a organização não-governamental Comunidade de Saúde, Desenvolvimento e Educação, a Comsaúde.

A base do trabalho era uma medicina comunitária, integral, reunindo amplo trabalho de promoção humana que incluía recuperação nutricional, combate às verminoses e avanço no sistema habitacional, explica o casal Eduardo e Heloisa Manzano, lideranças do movimento médico daqueles anos.

Da cidade, o programa “Medicina Simplificada” chegou à zona rural, criou postos de saúde equipados com agentes de saúde e médicos com visitas periódicas supervisionadas por uma comissão de saúde formada pelos profissionais, comunidade e instituições de saúde.

Da célula inicial, as ações se ampliaram com a criação de Centros de Recuperação Nutricional (CERN) e geraram convênios com a Universidade Federal de Goiás (UFG) que resultaram em estágios para alunos do sexto ano do curso de Medicina.

Anos mais tarde surgiu o projeto de Regionalização Docente Assistencial, que montou rede de assistência de saúde para municípios vizinhos. A atuação do grupo passou a ter respaldo da Organização Pan Americana de Saúde (OPAS) e a Fundação alemã Kellogg, que financiava projetos no Brasil.

“Foram desenvolvidos neste programa princípios como universalidade, equidade, descentralização, integralidade, hierarquização, integração e controle social que, posteriormente, foram estabelecidos pela constituinte como bases do SUS”, relembra Eduardo Manzano.

Muitos profissionais “formados” naquele modelo de saúde vivenciado em Porto Nacional participariam na luta pela reforma sanitária, que incluía participações no que ficou conhecido como Movimento Popular de Saúde (MOPS), cujas bases nasceram nos encontros nacionais de experiências em medicina comunitárias (ENEMEC).

Com a criação do Estado, cidades como Araguaína, Gurupi e Porto Nacional disputavam a condição de capital da nova unidade, mas Miracema acabou escolhida como capital provisória enquanto se definisse a construção da capital definitiva, Palmas, que teve a pedra fundamental lançada no dia 20 de maio de 1989.

Nos meses iniciais do novo estado, os profissionais da medicina fundaram as entidades basilares do movimento médico nas principais cidades.  Com a criação do Tocantins, os profissionais radicados na região decidiram criar as entidades médicas nos primeiros dias de 1989, quando o Tocantins se instalava na capital provisória, Miracema, com a posse dos mandatários eleitos no dia 15 de novembro de 1988.

"Me lembro bem que nós fizemos uma reunião preliminar antes, em Miracema, e nós combinamos que Araguaína ficaria com a Associação dos Médicos, porque lá tinha mais hospitais, tinha pessoal envolvido lá nos hospitais. Miracema ia ficar com o Conselho Regional de Medicina - CRM - e  porto com o Sindicato, que nós éramos mais experientes no movimento popular, então tinha mais o perfil sindicato".

Os portuenses saíam da cidade para a reunião em Miracema durante o dia e voltavam à noite. "Era uma viagem puxada daqui até Miracema, naquela época as estradas eram ruins", relembra Eduardo Manzano", que se dedicou mais à organização do Conselho Regional de Medicina, enquanto a esposa se dedicou ao sindicato. Heloísa, aliás, foi escolhida para o conselho fiscal na primeira diretoria eleita na fundação do sindicato.

O ato formal inaugural do SIMED-TO ocorreu em uma assembleia que reuniu 43 médicos no salão do Campus da UFG, na Avenida Presidente Kennedy, 285, em Porto Nacional.  Era o dia 18 de março de 1989.  Passava das 19 horas quando o médico Neilton Araújo de Oliveira abriu a assembleia seminal de fundação da entidade, que aprovou seu estatuto e elegeu a primeira diretoria e conselho fiscal.

Por ordem de assinatura, a lista de presença na assembleia de fundação do Sindicato dos Médicos no Estado do Tocantins, é a seguinte:

Evando de Queiroz 
Neilton Araújo de Oliveira
José Newton Moreira Disconzi
Eduardo Manzano 
Heloisa Lotufo Manzano
Nemésio Tomasella de Oliveira
Rosemary Latrônico Oliveira
Luzia Eunice Gomes de Santana
Adelson Oliveira de Lima
Alfredo Ramon Alfonso Cavalcante
Shigemi Isagawa
Radu Armand Sarbu
Adib Habib Georges Neto
Jaci Silvério de Oliveira
Maria Mônica Carvalho Miranda de Lima
Emerson José Ferreira de Lima
Pedro Ricardo Guedes Inchausti
Maria Aparecida Batista
Maria Darci Alves dos Santos
Gilberto Hatano
Abrahão Costa Martins
Ailton Lovato da Rocha
Renato de Souza Ávila 
Olegário de Souza Lima
José de Sena Rabelo
Vera Lúcia Quirino
Condorcet Cavalcante Filho (Condim)
Luiz Kimiaki Wada
Furtunato Soares Barros
Celia Bastos Amorim
Solimar Pinheiro da Silva
Eduardo Novaes Medrado Santos
Juarez Carlos de Carvalho
Sandra Maria Deotti Carvalho
Frederico Henrique de Melo
Cleber Mendes Mota
Hider Alencar
Gregório Coelho dos Santos
Merval Pimenta Amorin
Alberto Paiva de Moraes
Luiz Odenir Coelho de Souza
Maria da Soledade Silva Coelho
Tulio Cesar de Oliveira 

Confira nas próximas reportagens que serão publicadas nesta semana.